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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A segunda morte de Fernanda Lages

Numa longa entrevista a um programa de tevê local, o delegado Paulo Nogueira, da Cico, atacou duramente a memória da estudante Fernanda Lages, barbaramente assassinada em 25 de agosto. Ao invés de apresentar esclarecimentos sobre os 60 dias em que permaneceu à frente das investigações para, ao fim e ao cabo, nada dizer sobre o assunto, Nogueira agiu como se fosse uma pessoa acima do sistema legal do país e do estado.

A Cico, que ele representa, vem sendo duramente atacada pela sociedade piauiense por conta de sua desastrada atuação que, por absurdo que possa parecer, ainda conta com o apoio dos seus colegas, numa demonstração de que o corporativismo predominante na instituição beira as raias do irracional. Fernanda Lages está morta. A polícia deveria estar procurando os autores de seu assassinato. Deveria estar oferecendo respostas sobre as causas de tão horrendo crime.

No entanto, o delegado de polícia, escorado no apoio dos seus colegas, vem a público para atacar a vítima, para dizer que Fernanda tinha um comportamento negativo, era dada a relacionamentos dispersos e muito provavelmente até se prostituía. Na condição de responsável pela investigação, ele tem que apurar todos os detalhes sobre a vida do morto. O objetivo é tentar encontrar motivações para o crime no comportamento da vítima. Mas as informações obtidas têm que ficar com a própria polícia, porque a vida pregressa da vítima, publicamente, se encerra com o seu falecimento.

O comportamento do delegado Paulo Nogueira, na prática, provoca uma segunda morte da jovem Fernanda Lages. Não estamos querendo saber como ela se comportava na sua vida íntima. Importa apenas que ela nunca tenha praticado nenhum crime; que ela nunca tenha roubado ou matado ninguém; que ela nunca tenha agredido a conduta moral de quem quer que seja. E, principalmente, que ela não tenha agido no sentido de provocar nenhuma conspiração governamental.

A moda, para a polícia, é atacar o Ministério Público. Para os promotores, atacar a polícia. Isso não leva a lugar algum. Não ajuda a fortalecer nossas instituições. Mostra apenas o quanto somos frágeis e o quanto as pessoas que deveriam nos defender são, elas próprias, muito frágeis. Lamentamos profundamente pelo delegado Paulo Nogueira e pelo governo Wilson Martins. A Polícia Civil age sob o comando do governador. Se a Cico se comporta desta forma tão desorganizada e incompetente é porque tem apoio direto do palácio do governo.

O governador já pediu ajuda da Polícia Federal. Tem que fazer mais. Tem urgentemente que repensar a Cico. Do jeito que está, não pode continuar. Delegados que mandam mais do que o próprio governador. Que ttripudiam sobre o sentimento da população. Que afrontam a memória de um morto. Que agridem a dor dos seus familiares. Outros governadores tiveram pulso para extinguir grupos de elite dentro da polícia que estavam querendo assumir, para o mal, o controle da situação.

De acordo com o delegado titular do inquérito, o Ministério Público prejudicou as investigações. Vamos imaginar que os promotores de Justiça não tivessem entrado no caso. Teríamos, ainda em setembro, uma conclusão que foi amplamente ventilada pela imprensa, quem sabe, a partir de fontes policiais. As declarações de viva voz do delegado Nogueira demonstram muito bem de onde estas cogitações partiram na época. Teríamos uma conclusão de que Fernanda havia se matado. Sem que mais se dissesse, o caso estaria encerrado. E ponto final.